International Surgery Journal – relato de caso

Carcinoma urotelial em coto ureteral de paciente nefrectomizado por exclusão renal: relato de caso
Tadeu J. F. L. Campos*, Plinio H. F. Leandro, Lucas de O. Lima, André C. M. Lima, Lucas de A. Aquino, Marcos F. H. Rocha

Departamento de Urologia, Hospital Geral de Fortaleza, Fortaleza, Ceará, Brasil Recebido: 15 de dezembro de 2020
Aceito: 30 de dezembro de 2020
*Correspondência:
Dr. Tadeu J. F. L. Campos, E-mail: tadeucampos7@gmail.com
Copyright: © o(s) autor(es), editor e licenciado Medip Academy. Este é um artigo de acesso aberto distribuído sob os termos da Creative Commons Attribution Non-Commercial License, que permite o uso, distribuição e reprodução não comercial irrestrito em qualquer meio, desde que o trabalho original seja devidamente citado.

RESUMO

O carcinoma urotelial do trato urinário superior é uma doença rara e potencialmente agressiva. Raramente afeta o ureter e é bastante incomum no coto ureteral de um paciente que já foi submetido à nefrectomia por doença benigna. Descrevemos aqui o caso de um paciente do sexo masculino submetido à nefrectomia total esquerda por exclusão renal. Após três anos, devido a um episódio de hematúria, foi diagnosticado com tumor urotelial do coto ureteral, sendo submetido a ureterectomia e exérese do manguito vesical. O acometimento do coto ureteral por tumor urotelial é um evento extremamente raro e normalmente está associado a mau prognóstico devido ao atraso no diagnóstico inerente à apresentação atípica. O sintoma mais comum é a hematúria. A dor é incomum devido à ausência de unidade renal e, consequentemente, hidronefrose. Apesar de rara, devemos lembrar a possibilidade do aparecimento de tumores primários no coto ureteral e manter um alto grau de suspeição diagnóstica para evitar o diagnóstico em estágios avançados.

Palavras-chave: Nefrectomia simples, Tumor ureteral, Coto ureteral

INTRODUÇÃO
O carcinoma urotelial do trato urinário superior é uma doença rara, representando 5-10% de todos os carcinomas uroteliais. O envolvimento exclusivo do ureter é ainda mais raro, apresentando aproximadamente metade da incidência de tumores da pelve renal.

O principal fator de risco associado a essa neoplasia é o tabagismo; entretanto, outros fatores de risco, como exposição a aminas aromáticas e radioterapia, são conhecidos. A ocorrência de tumor urotelial primário do ureter no coto ureteral de um paciente já submetido à nefrectomia por doença benigna é bastante rara.

Nesses casos, a hematúria também é o principal sintoma; entretanto, a dor é incomum devido à ausência de unidade renal e hidronefrose. Nessas situações, o diagnóstico geralmente é tardio, devido à apresentação atípica, determinando mau prognóstico. Um alto grau de suspeição nesses casos é importante para o diagnóstico precoce.

Descrevemos aqui um caso de tumor urotelial localmente avançado do coto ureteral em paciente nefrectomia há 3 anos por exclusão renal, sendo diagnosticado por tomografia computadorizada após episódio de hematúria.

RELATO DE CASO

Um homem de 73 anos tinha histórico de hipertensão controlada e era ex-fumante. Foi diagnosticado com adenocarcinoma de próstata grau 3 da Sociedade Internacional de Patologia Urológica (ISUP) em 2011 e foi tratado com radioterapia associada à terapia de depravação androgênica, que evoluiu bem, sem sinais de recidiva.

Em 2016, foi submetido a nefrectomia total esquerda por exclusão funcional devido à degeneração policística do rim. O procedimento foi realizado por videolaparoscopia sem intercorrências e foi observada boa evolução do paciente nos anos subsequentes.
Após 3 anos, em 2019, após episódio de hematúria, a paciente foi submetida à tomografia computadorizada com contraste, que revelou nódulo sólido no coto ureteral esquerdo, sem sinais de doença linfonodal ou metastática. Assim, foi proposta uma abordagem cirúrgica com ureterectomia distal laparoscópica.
O procedimento foi iniciado por cistoscopia, que não evidenciou lesões vesicais; entretanto, foi detectado tumor urotelial brotando pelo meato ureteral esquerdo, o que necessitou de cirurgia aberta (Figura 1).

Figura 1: Imagem cistoscópica mostrando um tumor brotando através do meato ureteral esquerdo.

Foi realizada ureterectomia aberta, com exérese ampla do manguito vesical, sem complicações. O nódulo ureteral era volumoso, com acometimento da gordura periureteral e do músculo psoas, configurando estágio T4 (Figura 2).

No pós-operatório, a paciente evoluiu bem, com hematúria leve nas primeiras 24 horas, com resolução espontânea. O dreno pélvico tinha baixo débito, sendo retirado no terceiro dia de pós-operatório. No dia seguinte, o paciente recebeu alta com cateter vesical tardio para ser retirado no retorno ambulatorial.

No primeiro retorno ambulatorial, o paciente estava bem, sem queixas. O cateter vesical foi removido. O exame histopatológico da peça cirúrgica revelou carcinoma urotelial com margem lateral comprometida e compatível com estágio T4.
A paciente foi encaminhada para quimioterapia adjuvante com cisplatina e gencitabina, com boa aceitação. Foi submetido a cistoscopia precoce que evidenciou apenas uma área de hiperemia na topografia de uma ressecção do manguito, que foi biopsiada e não foi detectada neoplasia. A paciente evoluiu bem e foi acompanhada com cistoscopias e tomografias computadorizadas que não identificaram sinais de recidiva local ou à distância.

 

Figura 2: Peça cirúrgica: produto de ureterectomia distal com excisão do manguito vesical.

DISCUSSÃO
O carcinoma urotelial do trato superior representa apenas 5 a 10% de todos os carcinomas uroteliais. O ureter é um local menos comum para a ocorrência deste câncer. Esses tumores tendem a ter uma apresentação mais agressiva, sendo a maioria dos casos diagnosticada em estágios avançados.
O fator de risco mais importante para esses tumores é o tabagismo. Outros fatores associados incluem exposição a aminas aromáticas, consumo de ácido aristolóquico, infecções recorrentes e radioterapia. Em nosso caso, a radioterapia para câncer de próstata pode ter sido um fator causal da associação com o tabagismo.
A nefrectomia total simples pode ser realizada em diversas doenças benignas, como exclusões renais, traumas, tuberculose renal, pionefrose, entre outras. Nesta cirurgia, o ureter não é completamente ressecado, deixando um coto ureteral que pode ser o local do desenvolvimento do tumor primário.
O aparecimento de carcinoma urotelial no coto ureteral é uma condição rara, com incidência pouco conhecida na literatura. Nesses pacientes, a hematúria também é o sintoma mais comum; no entanto, devido à raridade dessa apresentação, o diagnóstico nesses casos é tardio. Esses pacientes geralmente não se queixam de dor significativa devido à ausência da unidade renal e hidronefrose.
A etiologia e patogênese dos tumores uroteliais em cotos ureterais fechados são pouco compreendidas. Pode ocorrer por inflamação crônica, refluxo ou exposição a substâncias cancerígenas e radioterapia pélvica.
Esses pacientes requerem um alto grau de suspeição diagnóstica para evitar o diagnóstico em estágios avançados quando o prognóstico é ruim. Apesar da ausência de tumor na peça cirúrgica da nefrectomia, o acompanhamento desses pacientes com exames de imagem é importante para um diagnóstico mais precoce.
Na ausência de doença disseminada e comorbidades que impeçam a cirurgia, esses pacientes merecem tratamento cirúrgico com ureterectomia e excisão do manguito vesical, com possibilidade de quimioterapia neoadjuvante ou adjuvante.

CONCLUSÃO
O carcinoma urotelial do ureter é uma doença rara e agressiva que requer diagnóstico e tratamento precoces. Apresentações atípicas, como neste caso, tendem a retardar o diagnóstico e comprometer o prognóstico. Assim, é necessário um alto grau de suspeição para este tipo de patologia.
Apesar de incomum, deve-se atentar para a possibilidade de tumores uroteliais nos cotos ureterais de pacientes já submetidos à nefrectomia por câncer de células renais ou causas benignas, e avaliação dos exames de imagem de acompanhamento deve ser realizada.

RECONHECIMENTOS
Os autores agradecem ao serviço de Urologia do Hospital Geral de Fortaleza.
Financiamento: Sem fontes de financiamento Conflito de interesse: Nenhum declarado Aprovação ética: Não necessária

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